A Receita Federal inaugurou dois novos canais de comunicação com os contribuintes, visando solucionar litígios tributários de forma consensual: os programas Receita de Consenso e Receita Soluciona. Essas iniciativas têm como foco principal promover a conformidade fiscal e facilitar a resolução de disputas sem a necessidade de processos judiciais prolongados. A proposta, que foi anunciada em 1º de outubro, marca um novo passo no relacionamento entre a Receita e os contribuintes de boa classificação em programas de conformidade.
Receita de Consenso: Incentivo à Conformidade Fiscal
O Receita de Consenso, regulamentado pela Portaria 467/2024, é direcionado a empresas que possuem uma boa classificação em programas como o Confia, o OEA (Operador Econômico Autorizado), ou que têm nota A+ no programa Sintonia. O principal objetivo é promover o diálogo para que as companhias resolvam pendências tributárias sem recorrer a litígios longos e custosos.
A criação do Centro de Prevenção e Solução de Conflitos Tributários e Aduaneiros (Cecat) será essencial para mediar esses conflitos. As empresas podem recorrer ao Cecat mesmo que já exista um processo fiscal instaurado, desde que não haja indícios de fraude ou crimes contra a ordem tributária. A Receita, por sua vez, analisará a viabilidade do consenso, considerando a jurisprudência, o nível de incerteza sobre os fatos apresentados e a controvérsia do tema.
Caso um acordo seja firmado, será lavrado um termo de consensualidade, garantindo que a Receita não poderá autuar a empresa por aquele fato específico. Em contrapartida, a empresa deverá renunciar a quaisquer processos administrativos e judiciais relacionados ao tema.
Receita Soluciona: Parceria com Entidades de Classe
Já o programa Receita Soluciona, regulamentado pela Portaria 466/2024, se destina a criar um canal direto entre entidades de classe e a Receita Federal. Instituições como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) poderão encaminhar dúvidas e questões tributárias de interesse coletivo.
Esse “canal VIP”, como foi denominado, visa criar uma relação de parceria entre a Receita e essas entidades, incentivando a conformidade e prevenindo litígios que poderiam afetar a estabilidade de diversos setores econômicos.
A Preocupação dos Especialistas
Embora os novos programas tenham sido bem recebidos por tributaristas, há preocupações quanto à exposição dos contribuintes a possíveis autuações fiscais caso o consenso não seja alcançado. A advogada tributarista Luciana Aguiar destacou que a ausência de uma solução clara para o caso de não haver acordo pode deixar as empresas mais vulneráveis a multas e sanções, caso os fatos discutidos no Cecat sejam posteriormente autuados pela Receita.
Outro ponto levantado por especialistas é que a adesão ao Receita de Consenso pode expor informações detalhadas das operações das empresas, aumentando o risco de autuações caso a Receita considere os dados apresentados irregulares.
Um Novo Paradigma no Relacionamento Receita-Contribuinte
O lançamento desses programas reflete uma mudança de mentalidade dentro da Receita Federal, que busca atuar mais como parceira dos contribuintes do que como um órgão punitivo. A iniciativa é parte de um movimento maior que visa facilitar o diálogo e a resolução de questões tributárias, com foco na conformidade e na confiança entre empresas e o fisco.
Para as empresas, especialmente aquelas que mantêm altos padrões de conformidade, esses novos canais representam uma oportunidade de resolver litígios de maneira ágil e sem os custos de um processo judicial. No entanto, é essencial que as companhias avaliem cuidadosamente os riscos envolvidos antes de aderirem aos programas, garantindo que sua exposição à Receita não resulte em autuações indesejadas. Os programas Receita de Consenso e Receita Soluciona inauguram uma nova era de conformidade tributária no Brasil, incentivando o diálogo e a solução pacífica de litígios. Para as empresas, essa é uma oportunidade de melhorar a relação com o fisco e evitar problemas futuros, desde que a adesão a esses programas seja feita com cautela e planejamento.
Adauto Junior
Contador e Consultor de Empresas
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