Menos imposto ou menos dívida?

Governo perde muito com ‘desonerações’, país não cresce e juros ainda são altos
O GOVERNO FEDERAL deixou de arrecadar R$ 35 bilhões no primeiro semestre devido a reduções de impostos, “desonerações”, soube-se ontem.
Extrapolando para o ano, dá pouco mais do que o equivalente a 1,5% do PIB. Com esse dinheiro no caixa, o deficit federal cairia a 0,2%. Quase zero.
Claro, se o governo não tivesse baixado impostos, o crescimento do PIB talvez fosse ainda menor neste 2013; a receita seria, pois, talvez, ainda menor. Portanto, a conta talvez não fechasse. Talvez. A coisa toda é enrolada. Logo, e daí?
Daí que essa conta de guardanapo serve ao menos para indicar que o governo federal não tem estado longe do deficit zero. Isto é, gastar apenas o que arrecada, ter um Orçamento equilibrado, não é nada impossível.
Entre 2007 e 2010, com a economia e a receita de impostos crescendo em geral bem, o governo bem poderia ter chegado ao equilíbrio.
Gastar apenas o dinheiro disponível da receita de impostos não é um sinal de superioridade administrativa ou, menos ainda, moral. Dadas certas condições, fazer dívida é racional e desejável, como sabe qualquer pessoa com algumas letras e números, além de bom-senso: se a dívida financia um investimento que dá mais retorno que a conta de juros, vale a pena, óbvio.
Nosso problema é que a dívida pública custa muito: taxa de juros de uns 16% ao ano; despesa de juros em torno de 4,8% do PIB, por ano. Seu financiamento tira muito dinheiro do setor privado, dinhei- ro que o governo, em geral, não gasta bem. De resto, a dívida ajuda a piorar a desigualdade de renda (quem tem dinheiro para emprestar ao governo é, claro, mais rico que o restante).
O deficit zero, o Orçamento federal equilibrado, teria efeitos provavelmente impressionantes no Brasil.
Em primeiro lugar, de cara “sobrariam” na mão do setor privado uns R$ 80 bilhões a R$ 90 bilhões por ano (dinheiro que o governo deixaria de tomar emprestado a fim de fechar as contas). Seria uma batata quente na mão dos poupadores e da finança, pois o dinheiro teria de ser posto em uso no setor privado, em vez de receber mansamente os juros do governo. Mas também seria uma grande oportunidade de investir: os juros na praça cairiam.
Segundo, o governo teria condições de obter juros menores e prazos maiores na rolagem da sua dívida. Apesar do deficit zero, o governo ainda teria, a princípio, de rolar anualmente uns 24% de sua dívida mobiliária (média por ano, o equivalente a quase 10% do PIB, uma enormidade). Mas poderia fazê-lo numa posição mais vantajosa.
Taxas menores implicariam, claro, despesas menores com juros. O governo poderia, assim, reduzir ainda mais sua dívida, ou baixar impostos de modo responsável e/ou investir mais. Além do mais, transferiria menos dinheiro para ricos (os que investem em dívida do governo, quase todo mundo da classe média alta para cima).
Seria um choque financeiro positivo, seria um choque produtivo (juros mais baixos para negócios), um choque de eficiência (pagamos impostos a fim de pagar juros para nós mesmos!) e um choque cultural (na nossa cultura rentista de gente acostumada a receber juros indecentes do governo).
Fonte: Folha de S.Paulo
http://www.4mail.com.br/Artigo/Display/024082000000000

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